quinta-feira, 23 de junho de 2011

Informação sigilosa: o mar não está para peixe

Dado que a grande imprensa não é mesmo confiável, eu tratei de ir à fonte. 

Não foi fácil de achar, em meio a disposições sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, a legislação da ANAC e da INFRAERO, a autorização para contratação de controladores de tráfego aéreo e outros que tais, mas lá está: pelo artigo 39, parágrafo único do RDC (Regime Diferenciado de Contratações Públicas), o governo PT-PMDB-sei-lá-mais-o-quê – que apesar de certas nefandas alianças teve, e ainda tem, o meu voto por uma questão de perspectiva política e histórica que talvez um dia eu tente defender junto aos meus leitores – propõe dar ao COI e à FIFA o direito de decidir quanto dinheiro do Tesouro do Brasil eles irão gastar com seu coliseu itinerante!! (As competições de alto nível são muito legais, leitor, mas se a gente pensar bem, a Olimpíada, como sugere o próprio nome, não passa de um Cirque du Soleil de semi-deuses do esporte). 

Em postagem anterior, insinuei que episódios desse tipo guardariam estreita relação com o “pacote de salvamento” que, por ocasião da quebra da roleta financeira norte-americana em 2008, o insuspeito Joseph Stiglitz, ex-economista-chefe do Banco Mundial, qualificou, em seu livro O Mundo em Queda Livre, de “O Grande Roubo Americano”.

Não me tome, caro leitor, por filosoficamente cético ou pessimista. Posso lhe assegurar, ademais, que estou feliz e de bem com a vida. Mas tenho cada vez mais presente a sensação de que, num futuro que já deu a largada, os Estados Unidos, indo daqui para lá, a China, vindo de lá para cá, com o Japão a reboque, e a Europa, como sempre no meio do caminho junto com os emergentes seus amigos, o Brasil incluído, acabarão misturados numa caótica sociedade burocrática pseudo-capitalista e pseudo-globalizada controlada por proprietários de imóveis, donos e executivos de bancos e gestores de fundos de pensão, com poderes equivalentes ao de concessionários – como nos tempos da tomada inglesa de Bengala – dos Tesouros dos Estados nacionais. 

Tudo isso, é claro, em meio a cataclismos climáticos cada vez mais severos e freqüentes. 

O COI, a FIFA e congêneres garantirão que as nacionalidades continuem a ser celebradas com a execução de seus hinos triunfantes nas batalhas desportivas e os “homens bons” irão regularmente à igreja pedir à mão invisível do mercado que assuma também o controle das intempéries. 

Resumindo, uma louca mistura de 1984 com Rollerball e Blade Runner

Possibilidades alternativas certamente existem, mas acho que vai ser preciso, de quando em quando, um showdown - em bom português, “botar o pau na mesa”. Porque não vai ser só com boas maneiras que sairemos desse imbróglio. 

Já lá se vão 23 anos da assinatura dos protocolos de Kioto e a impressão que se tem, a julgar pelas conferências de Copenhagen-2009 e Cancún-2010, é que o planeta não tem pressa. O cidadão instruído faz a coleta seletiva direitinho, nossas crianças aprendem a economizar água, os excluídos, porém honestos, dão sua contribuição ao esforço mundial de reciclagem vivendo da recolha de latinhas e o companheiro Minc faz das tripas coração com seus vistosos coletinhos étnicos (nesse quesito ele poderia, como dizia a minha avó, dar o braço ao companheiro Evo e sair correndo), mas os proprietários de terra estão mais preocupados em derrubar a floresta e se lixando para o problema de onde os pobres das cidades vão morar. Já os banqueiros, financistas e seus ventríloquos à testa dos Estados ricos têm coisas mais urgentes a tratar (a solvência da Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha e... Estados Unidos !) do que o derretimento das calotas polares, o desemprego estrutural, o planeta-favela e a economia bandida. (Alguém duvida seriamente de que tudo isso são aspectos de uma única sociedade planetária?)

Eu sugiro começarmos a pensar em democracias sem banqueiros (para que eles servem, afinal? – indagaria o proto-funcionalista Aristóteles) nem latifundiários rurais e urbanos e que os mesmos poderes soberanos dados no Brasil ao COI e à FIFA sejam outorgados, no mundo inteiro, em caráter experimental, ao Painel da ONU sobre Mudanças Climáticas! Pior do que está, eu acho que dificilmente iria ficar.

2011-06-23