segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Como de hábito

Imagem: Internet
Apesar da força indiscutível do bordão, o manifesto “Eleição sem Lula é fraude”, que se pretende instrumento de mobilização democrática contra um "puro ato de perseguição da liderança política mais popular do país", não passa de mal-disfarçado veículo de um abaixo-assinado de apoio à candidatura "Lula 2018" e à "união das esquerdas" por uma “vitória consagradora” sua em primeiro turno, [que] “significaria o fracasso do golpe [e] possibilitaria a abertura de um novo ciclo político”. 

Diz o manifesto que “o Brasil vive um momento de encruzilhada: ou restauramos os direitos sociais e o Estado Democrático de Direito ou seremos derrotados e assistiremos a definitiva implantação de uma sociedade de capitalismo sem regulações, baseada na superexploração dos trabalhadores”. 


Dado que a absolvição de Lula e a preservação de seus direitos políticos não têm, por si só, o dom de “restaurar os direitos sociais e o Estado democrático de direito” (até porque o governo deposto - pelo Congresso, com a cobertura do STF e por iniciativa da própria "base aliada" - foi o de Dilma, não o de Lula), muito menos de impedir “a definitiva implantação de uma sociedade de capitalismo sem regulações, baseada na superexploração dos trabalhadores”[*], deduz-se que os autores do manifesto só podem estar falando – de um modo francamente abusivo, salvo para os acólitos – dos efeitos esperados de sua recondução ao posto de presidente da República. 

Assinar essa “pegadinha” política é profundamente constrangedor para quem defende a absolvição de Lula no "processo do Guarujá" por insuficiência de provas, e a consequente preservação de seus direitos políticos, mas não tem intenção de reelegê-lo por discordar de sua atuação na Presidência e da política de seu partido.

O abaixo-assinado não visa mobilizar o maior número possível de pessoas em defesa dos direitos de Lula, mas coesionar seus próprios seguidores ao redor da mais recente contrafação petista da realidade brasileira - o "golpe da Lava Jato" - , agregar as personalidades de costume e os desavisados de ocasião e, na medida do possível, constranger os recalcitrantes do seu almejado monopólio da “política progressista” a concordar com aquilo de que discordam e dissuadi-los de desenvolver uma linha de ação independente.


Para mim, por exemplo, a eleição prevista para 2018 é fraude com ou sem Lula. Consumado o impeachment casuístico da presidenta eleita e estabelecido pelo tsunami de investigações em curso que o Congresso golpista é - perdoem-me as eventuais exceções - um antro de trambiqueiros, capachos do patronato e parasitas do Estado agindo à sombra da Constituição de 1988 e, desgraçadamente, dos próprios governos Lula e Dilma, só posso considerar legítima a eleição para um novo Congresso, ou Assembléia, de caráter Constituinte, imposto pelas multidões trabalhadoras - um tsunami democrático como o de junho de 2013, uma greve geral contras as reformas econômicas - com candidaturas oriundas dos movimentos civis e livre do poder do dinheiro e da aristocracia judiciária. 

Que espécie de "ciclo político", eu me pergunto, abrirá o governo Lula caso eleito, de maneira "consagradora" como quer o Manifesto, para administrar a massa falida da Nova República e seguir arrastando o seu cadáver insepulto?


PS: Os interessados podem acessar o manifesto e o abaixo assinado pelo link
https://www.change.org/p/sociedade-brasileira-em-defesa-do-direito-de-lula-ser-candidato-a-presidente-do-brasil  

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(*) "impedir a definitiva implantação de uma sociedade de capitalismo sem regulações, baseada na superexploração dos trabalhadores” é uma curiosa, mas extremamente significativa formulação da intelligentsia lulista, a indicar que seu programa é a manutenção de uma sociedade de capitalismo com regulações, baseada na exploração normal dos trabalhadores. 


2018-01-15