
O jihadismo islâmico contemporâneo é uma degeneração histórica do nacionalismo laico e mais ou menos democrático pan-árabe, sistematicamente desmoralizado por derrotas em mãos de xeiques, generais, sicofantas e todo tipo de espiões a soldo das potências norte-atlânticas sedentas de petróleo, mercados e poder estratégico, sob a ativa supervisão, a partir de 1948, do Estado dissimuladamente teocrático e racista, além de atômico clandestino, de Israel.
O fascínio exercido pelo terrorismo jihadista contemporâneo sobre segmentos da juventude islâmica emana, não por acaso, da Revolução Iraniana de 1979, vitória histórica tardia do mundo muçulmano contra as potências coloniais, cristalizada não mais no Estado parlamentar democrático divisado em 1952 por Mossadegh, mas no novo Estado teocrático política, cultural e militarmente dirigido pelos aiatolás xiitas.
Sob a égide de grupos políticos e paramilitares constituídos para a defesa desse Estado, como o Estudantes Islâmicos Seguidores do Imã – responsável pelo longo e momentoso sequestro dos funcionários da embaixada americana em Teerã, em novembro de 1979 - e outros associados à Guarda Revolucionária Iraniana, acostumados a se exibir com detonadores e explosivos atados à cintura, o nome deste ramo do islamismo entrou para o vocabulário mundial como sinônimo de “radical”, “anti-americano” e, por ilação, “terrorista”.
Por ironia - essa favorita da História -, o Estado Islâmico, ou ISIS, ou Daesh, é tido como um desdobramento direto da decisão de George Bush e seus pares de destruir, por motivo fútil, a casta burocrático-militar sunita de seu antigo peão Saddam Hussein. A Casa Branca é, pois, a principal animadora da nova convergência de objetivos e métodos entre antigos jihadistas xiitas pró-Khomeini, hoje em relativo desprestígio, com novos jihadistas sunitas ligados a Saddam.
Em perspectiva, é impossível evitar a ideia reflexa de que os ovos dessa serpente foram postos pelos titulares do Eliseu, de Downing Street, de La Moncloa e da Casa Branca a chocar nos vastos depósitos de miséria, precariedade e desemprego crônico do Oriente Médio, de onde sua prole acabou transportada, como por um inevitável efeito bumerangue do colonialismo da era da Internet, para os subúrbios empobrecidos de Madri, Londres e Paris.
O terrorismo político não nasceu ontem – mas, no mundo islâmico, aumentou vastamente o seu poder de destruição na proporção direta da disseminação do tráfico de armamentos financiado pelo petróleo e da democratização da violência proporcionada pela ideologia do martírio individual em nome da fé.
A única via para a sua superação é a elevação rápida, generalizada e sustentável dos níveis de vida material, política e cultural das nações árabes e islâmicas, algo que as potências estrangeiras, seus bancos, petroleiras e empreiteiras levam já um século tratando de impedir pelas vias da partilha territorial, da guerra delegada, do golpe de Estado e da repressão a cargo de suas castas sociais favorecidas.
O maior e mais eficaz inimigo histórico do terrorismo é, há muito tempo, o movimento socialista – e por uma razão simples: trata-se da única perspectiva capaz de, no mundo moderno, satisfazer a ânsia dos jovens por soluções solidárias, terrenais e sustentáveis, educando-os para a luta franca e aberta das massas trabalhadoras e camadas médias das sociedades nacionais pela conquista do poder político. O terrorismo islâmico floresceu, sem sombra de dúvida, no vácuo de autoridade ideológica - há muito tempo já espúria e em avançado estado degenerativo, não esqueçamos - legado pela agonia e morte do Estado burocrático herdeiro da revolução socialista de outubro de 1917.
Por isso, nada hoje é mais ensurdecedor do que o silêncio conivente das velhas organizações da classe trabalhadora com os chefes democráticos 'esclarecidos' dos Estados norte-atlânticos; nada mais angustiante e opressivo que a exposição total e incontestada das multidões urbanas de todo o mundo aos apelos histéricos de seus governos por uma guerra total contra 'inimigos da liberdade' nascidos e criados nos depósitos mundiais de lixo econômico de Wall Street.
O leitor não encontrará neste blog palavras de apoio às cruzadas civilizatórias da "comunidade internacional" contra os povos árabes e islâmicos, quer sejam lideradas por Cameron, Merkel, Rajoy, Putin, Hollande ou Obama!
2015-11-16
A redação deste ex abrupto foi disparada pelo desconforto do blogueiro com uma mensagem recebida do Avaaz com os dizeres "Os ataques em Paris e Beirute tiveram um motivo: desestabilizar a base de nossas sociedades".
A redação deste ex abrupto foi disparada pelo desconforto do blogueiro com uma mensagem recebida do Avaaz com os dizeres "Os ataques em Paris e Beirute tiveram um motivo: desestabilizar a base de nossas sociedades".
Leia também, neste blog,
“Todas são primaveras, mas algumas mais floridas do que outras” (05-01-2012)
“Carniça para os urubus” (16-12-2014)
“Queima de fogos em Bagdá” (01-01-2012)